A velha
Quando eu não souber seu nome
Conta pra mim
Se eu não lembrar
(e você se esquecer),
eu gosto de doce de leite e
doce de banana e
doce de leite com doce de banana.
Deixa eu comer todo dia,
um pote inteiro, pro fim da vida.
No meu vestido,
traga algodão branco
e florzinhas.
Leve como o dente de leão
(soprado que dá sorte).
Se eu perguntar uma,
duas,
três,
cem vezes.
Responda uma,
duas,
três,
cem vezes.
E me dá um beijo
na testa.
Se eu teimar, deixa.
Se eu queimar, assopra.
Se eu quiser tomar sol,
acenda a luz.
E, prin-ci-pal-men-te
Quando eu não lembrar meu nome
Me ame mesmo assim
amor
a ruga no rosto dele
a ruga no rosto meu
o cabelo branco dele
o branco escondido meu
o óculos pra perto dele
o óculos na testa meu
a idade chega pra ele
a idade chega pra eu
poesia
matar você com estricnina
é poesia
queimar você com maçarico
é poesia
sufocar você de amor
também é poesia
calendário
dias seguem
seguindo, seguinte
ele aqui
indo, vindo, rindo
rindo, indo, vindo
mergulho
na casa antiga,
ele mergulhou
na piscina de plástico
rasgou
escorreu água por todo lado
demos risadas
eu não escrevi uma linha – nada –
só agora
enquanto ele mergulha
no esquecimento
chora
por doze horas seguidas
eu deságuo em palavras
Carolina Schettini é mineira e mora no cerrado. Tem quatro romances: Re(a)mar, O quarto coração, No primeiro banco do lado esquerdo do balcão e Águas de Telhado; dois livros infantis: No céu e no mar e Bem; textos em coletâneas; uma poesia finalista no prêmio off-flip: João, e um miniconto em um livro didático: Caruncho. Ela adora viajar, assistir novelas, beber coca cola zero e contar histórias.