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Vivemos uma era na qual produzir mercadorias não é suficiente. Neste momento, você e eu constituímos aquilo que no capitalismo é denominado mercadoria e pensando bem, transitamos entre as redes sociais, produzimos conteúdos fúteis e amplamente comercializáveis, usando a nossa imagem em uma tentativa alucinante de representar algo, de ser alguém.

O capitalismo construiu um labirinto de tal forma, que não se acha a saída. As mais de 16 horas em solo fabril no início do século XVIII não foram suficientes para controlar toda nossa força de trabalho e porque não expandir seu sistema de controle e se apropriar de toda nossa “força de existir”, como uma representação da reprodução do capital, em si mesma?

O capitalismo nos transformou em um conjunto formado por corpos com menos saúde e um esvaziamento do que chamamos de “si mesmo”.

Enquanto conseguíamos produzir a quantidade de mercadorias solicitadas, operando como máquinas, os donos das fábricas se deram conta de que nos esvaziar de “si”, nos levaria a um outro nível de exploração de força de trabalho, produzindo muito mais, por muito menos. Agora, portanto, usufruir da nossa imagem é uma ideia ainda mais promissora, quando o assunto é exploração e controle. Uma imagem que pode ser vista em todos os lugares, a qualquer tempo, a qualquer momento, por qualquer pessoa.

Uma imagem que pode ser deturpada, fragmentada, e inclusive mal diagramada. Essa imagem que se teletransporta como pixels por todos os cantos em que a internet e dispositivos eletrônicos possam se conectar. 

Diante de tudo isso me pergunto: como ainda podemos oferecer algo ao capital? Será que ainda nos pertencemos? Será que ainda cabemos em nosso próprio corpo?

Não há resposta certa para esta pergunta, mas há algumas certezas em torno do que digo acima: tudo que produzimos já não nos pertence, mesmo que façamos parte [em contradição]; somos o que chamo de corpo-mercadoria.

A astuta estrutura que compõe o capitalismo é inacreditável! Ela nos faz acreditar que temos um domínio total do nosso corpo, e que por isso devemos nos mostrar nas redes sociais, expondo tudo que conseguimos “conquistar”. Fomos transformados em propriedade, mercadorias, sobre a qual nós [supostos proprietários], não temos o menor controle.

Uma tática muito eficiente para que continuemos sendo este corpo-mercadoria e fazendo o que a estrutura capitalista quer que façamos. Mesmo boa parte de nós sabendo de tudo isso, ainda acreditamos que temos total domínio sobre nós mesmos, afinal, não somos obrigados a nada!

Você acredita que faz o que quer com sua vida, com seu corpo, mas isso pode ser apenas uma grande ilusão. Você já parou para pensar, que parte do que você faz é uma escolha e parte são apenas respostas aos estímulos a que está sendo exposto continuamente? Nossos comportamentos e hábitos mudam constantemente, e você acaba se perdendo de quem era, passando a se comportar, exatamente como querem que você se comporte.

É como o corpo metamorfoseado de Gregor Samsa, em “A metamorfose”, de Kafka. Um corpo que perde a forma, que se perde no tempo e que não se reconhece, mantendo uma busca incessante por identificação com uma grande massa de pessoas que repetem a maquiagem, o corte de cabelo ou a forma do rosto, de acordo com o último vídeo que passou na sua linha do tempo. 

O que falar sobre este corpo que querem delimitar em um espaço e usá-lo como bem entendem? Essas são coisas que ficam passando na minha mente e compartilho, mas é por aqui, que desejo finalizar esse texto e virar essa chave, em uma tentativa um tanto frustrada de entender como é possível ter o controle. Na verdade, não quero ter o controle. Eu só quero poder ser livremente eu mesma, em todos os espaços.

Ah, eu quero é me sentir assim, inacabada. Pronta para ser refeita, para ser continuada. Apta a dar passos, em torno de mim mesma e recriar, apontar o que não gosto. Refazer desde o princípio. E continuar seguindo, fazendo aquilo que acredito que devo, sendo este corpo livre, totalmente capaz de me localizar nesse mundo. 

De me colocar enquanto pessoa, enquanto mulher, ser vista, ser encontrada, mas acima de tudo, não ser um corpo, que é apenas uma corpo-mercadoria

Fernanda de Moraes, nascida em Ilhéus, mas cidadã do mundo. Mestranda em Letras na UESB (PPGCEL), pensando os acervos, as escritas e as mulheres negras. Criadora de conteúdo no perfil Primeira Impressão (Instagram e Youtube), falando de livros, literatura e sociedade.

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